quinta-feira, 28 de outubro de 2021

Entropia e a morte das coisas

Conheci esse termo no conto do Asimov, a última pergunta, onde o último ser vivo no universo deixa uma pergunta ao computador universal: a entropia pode ser invertida? A jornada é complexa em um sci-fi puro sangue. No entanto, o que importa é que Asimov discorre sobre a entropia através de um narrativa com curtas histórias e pulos temporais bem elaborados para deixar claro o tamanho da escala do objeto.


A entropia é uma lei da termodinâmica que descrever como a energia se dispersa e que ela é uma força unidirecional, ou seja, ela tende a desordem. Isso quer dizer que podemos converter energia como o motor de um carro faz para poder deslocar-se, mas não conseguimos transformar os gases do escapamento novamente em gasolina e recuperar o movimento de deslocamento. Pois a tendência do universo é que a energia vá se dissipar totalmente e em algum ponto do tempo. A luz que nos mantém vivos irá acabar algum dia e, na minha interpretação, isso é a morte das coisas. Realizando em minha cabeça a ideia que tudo vai acabar, me percebo triste, pois a ideia de vida eterna sempre me pareceu esperançosa.

Agora preciso me explicar como um ateu, que sou, pode falar sobre vida eterna. Bom, eu creio que a vida é mais do que a visão aristotélica. Assim como a vida existia antes de nós, seres humanos, vai continuar após nossa extinção, então enquanto existir um ser unicelular se reproduzindo em uma sopa amniótica em alguma lugar a vida contínua a existir. Para deixar claro: céu, inferno, reencarnação ou transformação de água em vinho é ficção.

Voltando a tristeza mencionada, não seria exatamente sobre os trilhões de estrelas existentes com seu calor finito. Isso também me entristece, mas me refiro ao paralelo inevitável que faço com a nossa realidade e aos próximos que estão sendo desperdiçados, dos ensinamentos não aprendidos, da vivencia perdida, da amizade não exercida e servindo apenas à entropia.

A morte é um dos motivos da vida e sem ela o que chamamos de vida teria outros sentidos. Assim, quem teria pressa se não tivesse um limite de tempo? Qual seria o objetivo?

A nossa vida é finita, como a dissipação da energia, porém quando o finito é abreviado passa a ser triste. A dissipação da energia de todo universo está numa escala tão grande que para nós não faz muita diferença. Por isso, Asimov em seu conto faz saltos temporais de tantas gerações. Agora quando nosso tempo é abatido, a tristeza mostra como as coisas poderiam ser apreciadas e faz amargar a nossa imaginação inocente.

O amargor do momento é chamada de pandemia, ou COVID, um caos no nosso tempo. A doença não deixa consumir a energia que deveríamos dissipar durante a nossa vida. A pandemia é o nosso divisor de águas para o futuro trazendo a morte para o nosso cotidiano já tão massacrado pelas perdas de um Brasil moedor de gente. Como brasileiro isso é especialmente elevado à complacência cotidiana, pois convivemos com a violência terminada em morte todo os dias. Ainda mais, a morte no Brasil é explorada como espetáculo desde os hospitais que parecem açougues até o programas televisivos que nos fazem adormecer em sentimentos dormentes quando deveriam ser despertadores.

Os sentidos não adormecidos são dos que permanecem vivendo com seu luto perante ao abreviamento dos seus próximos. Os sentimentos dos entes dessas tantas vidas perdidas são transmitidas pelas redes sociais demonstrando a necessidade de curar aquilo que é incurável. A saudade desse perdidos, não apenas pela COVID, porém em período de pandemia trás o contraste dos sentimentos dormentes e o luto.

Não perdi ninguém próximo para COVID, mas assisti as pessoas perdendo a minha volta e o medo tomava conta de mim em muitos momentos. A paranóia dos cuidado estava me deixando doente e me afastou fisicamente dos meus mais queridos. Durante a pandemia a vida continuou e as pessoas também. Nem todos puderam ter quarentena, eu mesmo fiquei apenas 3 meses até voltar à trabalhar, e o COVID continuou a devastar. O luto dos perdidos é enorme e ainda mais devido as irresponsabilidades governamentais que pioraram nossa situação pública perante a pandemia.

No entanto a tristeza que me trouxe aqui não é relacionada as perdas por COVID, mas perdas de pessoas por outra causas durante a pandemia. Eu assisti online a dor de uma mãe e seu família pela perda de um filho e também a dor de amigos na perda de uma amiga que partiu fora do combinado. Percebendo a época merda para isso acontecer, eu realizo em minha mente uma fictícia imagem: a entropia em forma de setas iluminadas apontadas para cima se dissipando pelas mãos dos não dormentes tentando segurar essas luzes em vão. Enquanto nós, dormentes, assistimos todo sofrimento que é exposto deixando alguns indiferentes e outros sem saber o que fazer.

Essa imagem é aterradora, mas mais aterrador é como agimos por isso. Por vezes, a opção era desejar "meus pêsames" torcendo para que isso ajude de alguma forma. Mas no fundo sabemos na verdade é difícil fazer qualquer ação que ajude realmente. A entropia não pode ser invertida.

Hoje a crise diminui e a doença vai ficar no mundo. Vamos ter que aprender a conviver com ela, eu torço para que as pessoas se vacinem para dar segurança as pessoas à sua volta e progressivamente voltar as nossas vidas. E quando você voltar à sua vida cotidiana lembre de não apenas trabalhar para entropia seguir seu caminho unidirecional, mas aprenda todos os ensinamentos ensinados, vivencie toda experiência possível e exerça seu amor pelas pessoas queridas. Assim quando sua mente descansar não existirá sentimento de perda, mas sim de felicidade e, neste caso, deixe o resto com a entropia assim como o computador universal fez.